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Notas do Autor - Capítulo 18


Oi pessoinhas do meu corasa1 :v

Estamos de volta com a AEH, finalmente! Eu queria ter voltado em Maio, mas vocês já sabem como funciona o velho ShadZ. Dá um descanso pro infeliz e ele já acha que aposentou de novo...

Este foi o capítulo que preparou o terreno pra algumas coisas interessantes que vamos ver nesse arco de Slateport. Arco este que vai ter bastante coisa importante acontecendo, algumas talvez imperceptíveis, mas acredito que com a astúcia implacável de vocês eu nem vou conseguir esconder muita coisa. É o arco da Omega Saga que eu mais estava ansioso por alcançar. Aqui vai ter muita reviravolta, muitos conflitos e a apresentação de personagens novos também (alguns nem tão novos assim).

O capítulo do navio abandonado é mais um reaproveitado da AEH antiga (nessa versão ele era o capítulo 21, se não me falha a memória), e eu resolvi trazê-lo pra cá também. A diferença é que na AEH antiga era um capítulo que poderia facilmente ser descartado. O que o salvou de ser um filler foi um detalhezinho de nada que faria parte do plot principal, que é a mensagem do diário do Raizoh Cozmo sobre a tal fera marinha, que também foi readaptada. Aqui, nesta versão nova, adicionei algumas coisinhas a mais que serão esclarecidas no futuro, até pra dar um tempero a mais no capítulo.

"Mas ShadZ, por que usar o navio abandonado de RSE em vez de usar a Sea Mauville, já que a AEH nova segue os padrões de ORAS?"

PORQUE EU AMO AQUELE FUCKING NAVIO! A atmosfera dele é muito única! É algo que é de Hoenn, não tinha como ignorá-lo. E eu ter colocado o Raizoh como funcionário do navio, sendo que ele não era em RSE (ele só foi funcionário da Sea Mauville) foi apenas uma liberdade de adaptação que eu resolvi tomar. Vocês vão ver outras coisas do tipo, que foram readaptadas de RSE pra substituir o que existe em ORAS. Até porque se eu fosse seguir ORAS à risca, sequer teríamos a Batalha da Fronteira pra Miriam disputar (obrigado, Game Freak, não é de hoje que vocês me deixam puto da vida).

E falando na nossa adorada protagonista, a partir daqui as coisas começam a mudar bastante pra ela. Que treta é essa dela com a Anabel? Que raios aconteceu no passado pra Miriam ficar tão alterada depois dessa exploração que quase deu muito errado?

E isso que eu não vou nem comentar sobre o cara lá que apareceu no final...

Até a próxima, pessoal! õ/


Capítulo 18

O navio abandonado


O barco de pesca de Briney seguia o mais rápido que podia em direção ao leste. Com ele estava Sapphire, Ruby e Miriam que aproveitavam a direção que o marinheiro tomava para pegarem uma carona até Slateport, próximo destino dos aventureiros.

Apesar da idade da embarcação, ela seguia a todo vapor saltando de onda para onda, parecendo voar raso na superfície da água. Briney estava calado durante o trajeto, focando em cada detalhe ao longo da rota para não perder a direção que devia seguir, já que o lugar onde queria chegar era bem escondido de vista até mesmo para os navegadores mais experientes.

Entre o trio de treinadores as expressões eram mais variadas, desde um Ruby emburrado por ter que aturar o cheiro de água de peixe impregnado no barco até Sapphire sorridente encarando suas duas insígnias da Liga Pokémon e Miriam interagindo com sua Mudkip.

— Nesse ritmo a gente nem demora muito pra chegar — comentou Sapphire, lustrando a recém-conquistada insígnia de Dewford. — Slateport é um pouco mais afastada de Dewford do que Petalburg, mas do jeito que o Sr. Briney tá indo rápido eu acho que não vai ter muita diferença de tempo.

— Ele deve estar com muita pressa, seja lá o que ele pretende fazer — comentou Miriam, tendo o cuidado de falar baixo para que não fossem ouvidos pelo velho. — Vocês acham que isso tem alguma relação com aquilo que aconteceu antes de Dewford?

O trio ficou em silêncio. Eles se encaravam com seriedade. Se a resposta para a última pergunta de Miriam fosse positiva, havia neles a preocupação de que talvez estivessem indo em direção a mais problemas. E mais uma vez em alto-mar, onde não havia fuga para um lugar seguro. Um novo encontro com a Team Aqua era a última coisa que desejavam.

— Não sei, não acho que o Sr. Briney nos levaria para uma situação perigosa — questionou Sapphire.

— Da outra vez ele também não estava, mas o perigo veio até ele e nos pegou de brinde — Ruby retrucou. — Fala sério, gente! Aquele homem tem coisas a esconder de nós. Aqueles bandidos saberem quem ele é não foi coincidência.

— Não pude usar meus Pokémons naquela noite, porque estávamos isolados — disse Miriam cerrando os punhos com força. — Em terra firme eu teria acabado com aqueles dois.

— É muito fácil fazer suposições de algo que já passou, mas nunca dá pra ter certeza do que poderia ter acontecido caso as condições fossem diferentes — Ruby dizia enquanto se levantava para andar até a grade do barco, onde se apoiou. — Se estivéssemos em terra firme você poderia ter batalhado sim, mas eu e Sapphire não somos treinadores experientes como você, o Sr. Briney parece ter apenas a Peeko, que não é um Pokémon preparado para batalhas e não sabemos o nível daqueles criminosos. Você talvez tivesse entrado em batalha, mas o resultado dessa afronta poderia ser pior.

A menina ajeitou seus óculos e bufou, demonstrando estar contrariada com as palavras frias de seu amigo, mas não tentou contra-argumentar. No fundo sabia que ele estava certo.

— Não consigo derrotar dois criminosos quaisquer, como eu vou encarar os outros Cérebros da Fronteira?

— Os Cérebros da Fronteira não vão ameaçar te matar se você mostrar resistência — afirmou Ruby.

— Verdade, mas tem uma que eu preferiria morrer logo a ter que encarar agora — Miriam se debruçou na grade de segurança do barco.

Sapphire e Ruby trocaram olhares confusos, sem entender muito bem o que a companheira queria dizer com aquilo.

— Quem seria essa? A Greta?

— Não, a Greta é a próxima — Miriam respondeu. — E parece ser uma pessoa divertida.

Sapphire não desistiu com a primeira negativa.

— Então a Lucy!

— Também não, a Lucy é uma das treinadoras que eu mais desejo conhecer.

— Você disse “uma”, e de mulheres na Batalha da Fronteira então só sobrou a Anabel.

Os ombros de Miriam deram uma sacudida involuntária, fazendo Sapphire revelar um sorriso triunfante.

— Então é ela — disse a garota.

— Qual o problema com a Anabel? — questionou Ruby. — Ela é uma treinadora respeitadíssima no mundo inteiro! Fora o fato de que ela é um membro da Polícia Internacional, uma pessoa brilhante que ajudou a desenvolver o setor de inteligência deles.

— Podemos mudar de assunto, por favor? — a garota indagou com rispidez. — Eu já sei de tudo isso, já estive com ela antes, e por isso mesmo eu tenho receio dessa batalha. Prefiro não explicar o motivo agora...

Dado o ponto final no assunto os três ficaram em silêncio por quase duas horas, até o momento em que o barco fez uma manobra para a esquerda, mudando sua direção original.

Quando os jovens se deram conta um estranho borrão apareceu no horizonte. Seu tamanho aumentava na medida em que Briney ia avançando em direção a ele, fazendo-os se perguntarem o que era aquilo. Não demorou muito para descobrirem que se tratava de um enorme navio encalhado em um banco de areia no meio do oceano, cujos danos na lateral do casco indicavam um possível abalroamento.

O barco de pesca emparelhou com uma rampa de acesso na lateral do navio. Briney desligou o motor e finalmente saiu da cabine para observar a melhor maneira de ir de uma embarcação para a outra. Quando finalmente saltou por cima da grade lateral do seu barco, o velho voltou sua atenção para os treinadores.

— Eu já volto. Vocês ficam aqui, o lugar não é seguro.

O ex-marinheiro subiu a rampa e desapareceu da vista dos três quando chegou à parte de cima. Os treinadores resolveram se dirigir à parte de dentro do barco para fugir do sol escaldante, uma vez que com o barco parado eles não teriam a ajuda do vento para afastar o calor intenso que os castigava naquele dia.

Sentados à mesa da pequena cozinha improvisada, os viajantes começaram a ponderar sobre o que Briney pretendia ao se colocar em uma situação de tamanho risco.

— Ele fala para não irmos porque é perigoso, mas ele mesmo também não está seguro lá em cima. Idade avançada, se algo acontecer vai ser um problema pro Sr. Briney sair de lá — comentou Sapphire.

— Eu só quero entender o que ele veio fazer em um navio naufragado no meio do nada — questionou Ruby, não escondendo seu descontentamento. — Aquilo ali está caindo aos pedaços, está todo corroído! Sabe-se lá quanto tempo faz desde que foi parar ali. E se acontecer alguma coisa estaremos perdidos no meio do oceano, sem saber se algum dia alguém vai nos avistar, pois estamos fora da rota marítima.

— Quando fomos atacados pela Team Aqua eles não mencionaram um mapa que levava a um navio naufragado? — Miriam perguntou, mantendo a voz baixa.

— Miriam, pela última vez, esquece essa gente! — Ruby parecia nervoso, encarando a amiga nos olhos. — Isso é problema dele, uma vez que estivermos em Slateport vamos continuar seguindo nossas vidas e nunca mais nos envolver com esse cara de novo.

A menina, no entanto, não parecia estar dando ouvidos a Ruby. Pegou sua mochila, revirou o conteúdo dentro dela, e partiu em disparada para fora do barco. Ruby e Sapphire se entreolharam apreensivos.

— Ela não vai fazer o que eu acho que ela vai fazer, não é? — indagou a garota.

— Eu sei que eu vou me odiar por dizer isso, mas vamos atrás dela antes que aconteça alguma desgraça.

• • •

Quando finalmente alcançaram Miriam, Ruby e Sapphire se depararam com um cenário não muito amigável. Os papéis de parede descascados, o chão de metal corroído pela maresia, a escassez de luz e uma corrente de ar fria que passava pelo corredor, parecendo atravessá-los causando a sensação de que estavam sendo perfurados por uma lâmina afiada, era o conjunto perfeito de fatores para alertá-los de que não deveriam estar ali.

— De onde vem esse vento frio? — Ruby protestou ao mesmo tempo em que se encolhia em seus próprios braços. — Estava um calor insuportável lá fora!

Miriam retirou uma lanterna da mochila, que usava para vasculhar cada canto daquele ambiente hostil. Vez ou outra perturbava um dos Zubats que descansavam pendurados nos encanamentos do teto, mas não se incomodava com a presença deles. Parecia estar atenta a qualquer outro detalhe que pudesse aparecer fora do lugar.

— Estranho... — sussurrou a menina. — Sem rastros do Briney. Será que ele entrou por algum outro lugar?

— Miriam, vamos voltar — disse Sapphire. — Aqui é perigoso.

— Só um momento, eu preciso verificar uma coisa. Se quiserem voltar para o barco fiquem à vontade, eu desço logo depois.

— E se o Sr. Briney voltar antes de você? Como vamos dizer a ele que você veio para cá mesmo ele nos dizendo para não vir?

— Ele não tem controle sobre minha vida. Confiem em mim, não vou demorar, só quero confirmar uma teoria.

— Você por acaso não está tentando detectar algum rastro da Team Aqua, está? — Ruby já parecia estar perdendo a paciência de novo, nas últimas horas ele parecia ter se convencido de que Miriam contraíra alguma obsessão em caçar os criminosos.

A menina se colocou de frente para o amigo, ajeitou o casaco e manteve o seu semblante sério.

— Não posso explorar um lugar abandonado? Não é isso que treinadores aventureiros fazem?

— Não quando o lugar pode desabar e matar a gente. Não está parecendo que você é uma treinadora experiente.

Miriam pareceu ter sentido o impacto da última fala de Ruby. Ela semicerrou os olhos, com a lanterna já apontada para baixo, encarando o garoto de frente com uma expressão já beirando a irritação.

Ela, porém, ignorou por completo a resistência de seus companheiros e seguiu pelos corredores daquele andar. Não se sentia confortável com o assoalho de metal emitindo rangidos altos a cada passo que dava, a impressão que tinha era a de que a qualquer momento um buraco se abriria debaixo de seus pés, mas estava disposta a achar alguma pista que a colocasse no rastro da Team Aqua. Queria vingança pelo terror que a fizeram passar naquela noite.

Entrava de sala em sala, fazendo uma varredura minuciosa nos cantos mais escondidos de cada cômodo, tentando encontrar qualquer coisa que lhe desse alguma informação. Ela se aproximou de uma cristaleira próxima à porta. O móvel estava com as prateleiras vazias e a madeira já demonstrava sinais de desgaste. Miriam puxou as gavetas e encontrou uma pequena pasta em uma delas.

A menina se sentou à pequena mesa que havia no local e abriu a pasta para verificar o que havia dentro. Apenas algumas cartas, cujo tom amarelado do papel era um claro indicativo do tempo que levava desde que foram escritas. E em um ambiente tão hostil, com aquele nível de umidade, era curioso o fato de que não tinham se desmanchado depois de tantos anos.

— Takao Cozmo e Raizoh Cozmo... — Miriam sussurrou enquanto lia os nomes escritos em todas as cartas e analisava seu conteúdo. — Pelo visto só uma troca de cartas entre um garotinho e o pai dele. Como será que esse menino está agora?

A garota guardou a pasta contendo as cartas na mochila e voltou a procurar por pistas no cômodo em que estava. Ao verificar outro móvel encontrou um livro de capa preta, sem nenhuma gravura ou escritos. Notou que o objeto possuía uma correia com fivela, tornando a sua abertura mais trabalhosa.

Um diário? — pensou, confirmando a resposta logo em seguida, quando desfez a trava da fivela e o abriu. — “Propriedade de Raizoh Cozmo, engenheiro elétrico do navio cargueiro RSE-0017 da Marinha de Hoenn”.

Ela folheava o diário a procura de alguma informação que pudesse dar uma pista do motivo pelo qual a Team Aqua queria ir àquele local. Não encontrava nada além de alguns registros de missões infestados de termos técnicos que ela sequer imaginava o que poderiam significar. Tantas outras páginas estavam corroídas, tornando-se ilegíveis.

Mas uma única folha contendo um texto breve chamou a atenção de Miriam. Seus olhos travaram nos dizeres rabiscados por uma caligrafia trêmula.

“Nenhuma ação é perene. Como tal, o sono profundo da fera primordial, que há milhares de anos oculta de nós sua majestosa existência nas profundezas do vasto oceano. Temei, meros mortais! O imponente guardião está vindo! O Imperador dos Mares há de despertar em breve!”

— É cada uma que me aparece... — a garota sussurrou fazendo uma expressão de estranheza, mas acabou guardando o diário em sua bolsa, junto das cartas recém colhidas.

Quando saiu da sala em que se encontrava, Miriam se deparou com Ruby e Sapphire acompanhados de Briney. Os amigos pareciam apreensivos, enquanto o velho a lançava um olhar nem um pouco satisfeito.

— Com isso está completo o trio de bisbilhoteiros — resmungou com sua voz rouca. — Este navio é pertencente à Marinha de Hoenn. Não mandei ficarem no barco só porque é um local perigoso. Ainda que ele estivesse novo em folha vocês não teriam permissão para estar aqui. Vamos indo!

Quando Briney se virou para a direção que acreditava ser a saída do navio, não esperava encontrar uma parede sólida de aço indicando o fim daquele corredor. Devido à distração causada pela surpresa, os quatro não perceberam quando as demais rotas de fuga também desapareceram, fazendo com que eles estivessem agora em uma grande sala fechada, com chão, teto e paredes de aço, e muito mal iluminada.

Invasores, como ousam macular meu local de descanso? — uma voz mórbida ecoou pelas paredes da sala, deixando todos em estado de alerta. — Se fazem tanta questão de estar aqui, então ficarão para sempre!

— O que foi isso? — perguntou Sapphire, procurando a origem daquela voz enquanto caminhava para trás até que suas costas se encostassem às de Ruby, que tremia sem conseguir sair do lugar.

— O espírito do navio — disse Briney em voz baixa. — Então ele realmente existe.

— Explica melhor essa história de “espírito do navio”, não acho que estamos em uma situação confortável aqui!

As luzes da sala piscaram de forma agressiva, ao mesmo tempo em que os presentes tinham a sensação de que a sala estava balançando como se fosse um terremoto. Briney se segurou na haste de metal de uma das lâmpadas da parede, enquanto os três mais novos foram ao chão.

— É uma lenda contada desde poucos anos antes de eu me aposentar da Marinha. Diziam que um espírito havia se apropriado deste navio e não deixava mais ninguém entrar. Parece que somos reféns dele agora.

Aos poucos uma densa névoa púrpura tomou conta do ambiente. As luzes baixas deixavam a sala envolta pela penumbra. Por trás do nevoeiro uma figura estranha tomou forma, aparecendo de frente para os prisioneiros. Não tinha um corpo físico, apenas uma pedra de onde emanava um denso gás de cor roxa. Outra substância, de cor verde bem vibrante, também emergia da pedra e parecia desenhar um rosto perverso na concentração de gás.

— Um Spiritomb? — indagou Sapphire. — O que um Pokémon desse está fazendo aqui nesse navio?

— Reza a lenda que um Spiritomb é formado por cento e oito almas aprisionadas na pedra que é a base de seu “corpo” — disse Briney. — Todo o ódio e rancor acumulados de todas essas almas aprisionadas definem o nível de poder e maldade do Spiritomb que os aprisiona. Se formos pegos e aprisionados por ele, só vamos servir de alimento para deixá-lo ainda mais poderoso.

O Spiritomb dirigiu o olhar para Miriam. Parecia escanear a garota até o fundo de sua alma.

Este navio agora é onde eu resido, se tornou minha posse. — disse o fantasma, usando algo que se acreditava ser telepatia. — Você roubou coisas daqui, eu consigo ver. Sua alma... Sinto vindo dela uma mistura de sentimentos. Insegurança, medo, rancor, muito rancor. Eu a quero mais do que qualquer outra presente nesta sala. Me entregue sua alma, e prometo guardá-la como um troféu inestimável.

Miriam deu dois passos para trás, colocando a mão no bolso com sutileza a fim de não ser notada.

— Não pretendo entregar minha alma pra uma criatura que eu nem conheço — devagar ela tirava do bolso duas Pokéballs. — Ainda tenho algumas coisas pra resolver nesse mundo.

Como contar a verdade aos seus amigos? — rebateu o Spiritomb, em tom de voz malicioso. — Me parece que todo o medo que você acumula vem justamente do seu pequeno segredo. Será que você consegue?

— CALA A BOCA! — em estado de fúria ela lançou as duas Pokéballs em direção ao Spiritomb. — Venomoth, Mudkip, vamos!

Os dois Pokémons escolhidos para o confronto se puseram em posição de ataque frente ao Spiritomb, que se mantinha calmo até o momento. Ao avaliar a situação de desvantagem numérica sua reação, bem diferente do que Miriam e os demais esperavam, foi dar uma gargalhada diabólica que ecoou pelas paredes da sala fechada causando uma sensação agoniante em quem a ouvia.

Muito inteligente de sua parte trazer dois membros de sua equipe para lutar comigo! Você sabe que não é forte o bastante para me derrotar do jeito que está agora.

— É o que veremos — com um semblante sério a menina ajeitou a armação de seus óculos e iniciou a batalha dando os primeiros comandos. — Venomoth, tente o Sleep Powder! Mudkip, eu quero que você inicie com o Foresight!

Shin, o Venomoth, disparou voando rasante em direção a Spiritomb.

— Concentre-se em fazer o que a mestra ordenou, novata! Eu vou mantê-lo ocupado.

Foresight... Que técnica é essa mesmo? — a pequena Mudkip se mantinha tentando lembrar como fazer aquele movimento, enquanto sua fala arrastada traduzia seus próprios pensamentos. — Ah... Acho que lembrei.

— Hoje vai ser difícil, pelo visto — o Venomoth lamentou. — Uma pena que a Maggie não pode batalhar nesse ambiente, ela demoliria tudo em um instante. Se bem que isso mataria todos nós.

Shin, no entanto, procurou recuperar o foco e lançou uma cortina de esporos de cor esverdeada na direção do Spiritomb, que recuou para não ser atingido. A Mudkip, por sua vez, conseguiu travar o foco no Pokémon fantasma para realizar uma tarefa de identificação de sua estrutura corpórea, ainda que com um pouco de dificuldade em função de seu raciocínio lento.

Após desviar do ataque de Shin, o fantasma desapareceu de vista ao penetrar uma sombra que se abriu no chão.

Shadow Sneak? — pensou Miriam, mas antes que ela percebesse o Spiritomb reapareceu nas suas costas, parecendo emitir um sorriso maligno.

Não achou que eu fosse ficar parado para receber os seus ataques, não é?

A criatura espectral inundou o local em sombras. Ele conseguia focar apenas em Miriam, já que Sapphire, Ruby e Briney estavam paralisados de medo.

Parece que somos só nós dois!

A mochila de Miriam emitiu um brilho de tom roxo, sendo removida de suas costas. Ela se abriu sozinha, e de seu interior vários objetos saíram flutuando, desde os documentos que a menina pegou no navio, provisões para as viagens e pertences pessoais.

Um deles chamou a atenção do fantasma. Era um surrado Raichu de pelúcia, que tinha preso em seu peito um bottom imitando a insígnia do ginásio de Vermilion, cidade onde a garota havia sido criada na infância.

Ah, sim... Um item de valor sentimental inestimável. — o Spiritomb sussurrou.

— O que você pensa que vai fazer com isso? — ainda que tentasse manter a calma, era perceptível um vestígio de desespero tomando forma na voz de Miriam.

O fantasma aos poucos foi desaparecendo, ao mesmo tempo em que o Raichu de pelúcia pousou com leveza. Os olhos do brinquedo então começaram a brilhar em um tom intenso de azul, enquanto todo o seu corpo emanava uma aura roxa e nefasta.

Como se a pelúcia se manter em pé não fosse surpreendente o bastante, a mesma agora emitia ruídos estranhos e duplicados. Com o tempo, os quatro perceberam que o barulho indecifrável ia se tornando uma voz. Era como se duas vozes se pronunciassem ao mesmo tempo, uma grave e outra aguda, emitindo um som demoníaco que proferia palavras macabras em sussurros agoniantes. Tal qual um rádio fora de sintonia, a voz se assemelhava a uma mistura de frequências que a tornavam aterrorizante.

Vamos, faça como a pequena Miriam e brinque comigo! — ressoou a voz diabólica.

Ruby e Sapphire estavam assustados o bastante com aquele caos sobrenatural para perceberem o estado de desespero em que Miriam havia se colocado. A treinadora cerrava os punhos com tanta força que parecia estar tentando perfurar as palmas das mãos.

— Devolva isso — a voz da garota disfarçava suas súplicas por trás de um tom grave e imperativo. — Ou vamos destruir você.

Acha que consegue? — o Spiritomb então gargalhou em deboche. — Tentem me atacar, e é o seu precioso brinquedinho que vai ser destruído!

O ser fantasmagórico, porém, era livre para atacar da forma como desejava. A criatura mirou um Dark Pulse na direção da Mudkip, mas Shin foi mais rápido em carregar a parceira para longe do alcance do ataque.

Miriam percebeu que após disparar o ataque a costura de um dos braços da pelúcia começou a desfiar. Não conseguia pensar em como vencer aquela batalha sem danificar aquele brinquedo velho que a acompanhava desde criança, como um primeiro amigo que havia conquistado em uma época que não voltaria mais.

— Esse Raichu de pelúcia eu ganhei quando fui assistir uma batalha do Surge no ginásio de Vermilion. Foi ele próprio quem me deu — disse a garota com a voz falhando. — É a recordação mais antiga do que eu queria ser, de onde eu queria chegar.

Realmente tocante, mas sua alma precisa ser mais lapidada — respondeu o fantasma. — Vamos trabalhar um pouco mais o seu ódio.

Sem aviso prévio o Spiritomb surpreendeu a todos com uma rajada de vento que lançou Shin e a Mudkip para longe, bem como foi forte o bastante para desequilibrar as quatro pessoas que ali estavam. O vendaval, além de ser visível devido à corrente de ar ser tingida por uma aura púrpura, ainda trazia a sensação de levar aos ouvidos de todos ali presentes gritos de almas perdidas, implorando desesperadamente por salvação.

O ataque fez efeito em Miriam, já psicologicamente fragilizada pela sequência de lembranças que vinham à tona em sua mente, e a pressão para não deixar que aquele Spiritomb revelasse o que quer que a menina quisesse esconder. Medo e remorso se apossaram da treinadora, que fazia força para continuar de pé.

— Muito bem, já chega — disse Sapphire, ainda com dificuldade de se reestabelecer, sacando uma de suas Pokéballs. — Não posso ficar mais assistindo isso, vou dar um jeito nessa... Nessa... “Coisa”!

— Não temos força para lidar com ele ainda — falou Ruby em tom de preocupação, também sacando uma Pokéball. — Vamos batalhar juntos e torcer para que ele dê alguma abertura.

— FIQUEM FORA DISSO! — Miriam berrou, assustando os amigos e até mesmo Briney. — É comigo que ele quer brincar, é algo importante pra mim o objeto que ele possuiu, foram meus companheiros de equipe que ele lançou pra longe agora com esse último ataque! Essa briga ficou pessoal há muito tempo.

E então ela percebeu que o último ataque desferido pelo Spiritomb havia danificado severamente o pequeno Raichu. A costura lateral se desfez, e o enchimento de algodão começava a vazar por todos os lados. Além disso, alguns rombos começavam a aparecer, indicando que o tecido também não resistiu à energia do golpe.

Miriam sabia, no fundo, que poderia costurar seu Raichu de pelúcia novamente, mas ele nunca mais seria o mesmo. Segurando o máximo que podia as lágrimas que teimavam em tentar se formar em seus olhos, a garota apenas permaneceu inerte de frente com o espírito que enfim saía do controle do brinquedo. A figura macabra estava de volta à sua forma original.

Talvez eu tenha exagerado um pouco nesse último ataque — disse, com um riso abafado. — Mas valeu a pena, consigo sentir o ápice de seu ódio aflorando. Sua alma está pronta, vou tomá-la agora.

— Hã? É comigo que você está falando? — indagou a garota, seu tom de voz expressava total desilusão.

Sim, com você mesma. Agora seja uma boa menina e me deixe consumir a sua alma.

— Eu não vou entregar merda nenhuma a você, sua criatura asquerosa — era possível perceber a raiva crescendo na voz da garota. — Você se gaba só por ser um fantasma, não é? Não acha que já passou mais tempo do que deveria no nosso plano?

A expressão debochada do Spiritomb desapareceu na mesma hora. O fantasma não tinha a intenção de lidar com a resistência de alguém cuja felicidade havia acabado de destruir.

Não seja teimosa. Venha, vou libertá-la desse sofrimento.

— Você ainda não sabe o que é sofrimento, mesmo depois de tanto tempo a mais que você ficou no nosso mundo. Mas eu vou te mostrar o que é sofrimento de verdade — a garota estalou os dedos e na mesma hora seu Venomoth e sua Mudkip reapareceram. — Vamos finalmente mandar você embora desse mundo... Direto para o inferno!

Ao ordenar o ataque com toda a força, seus Pokémons deram um fim à maldição daquele navio. Quebrando o protocolo de batalhas oficiais, Shin e a pequena anfíbia investiram em uma sequência de golpes que não deixaram o Spiritomb sequer respirar. Ao final, quando o fantasma estava quase todo recuado para dentro da sua pedra, Shin a destruiu com um Aerial Ace direto no centro da rachadura.

A treinadora por fim se aproximou dos restos da pedra, lançando um olhar de desprezo.

— Não estava ansioso para ver como a pequena Miriam brinca? — ela então cuspiu onde estava a pedra partida. — Agora tenha pesadelos com ela pela eternidade!

Por fim ela se pôs a recolher os pedaços de seu Raichu, em silêncio, sem ao menos olhar para qualquer outra pessoa que ali estivesse com ela. Ruby e Sapphire acharam melhor não fazer perguntas, apenas ficaram aguardando para poderem sair dali.

A sala sem saída em que Spiritomb os havia colocado se transformou de volta para o corredor que usariam para sair do navio. Ao voltarem para o lado de fora encontraram Peeko empoleirada no corrimão da rampa lateral. Por lá desceram até a embarcação de Briney e tomaram rumo em direção a Slateport. Nem mesmo o pôr-do-sol era capaz de lhes trazer algum bom sentimento naquela hora.

• • •

Do alto de uma colina na Rota 110 um rapaz avistou a famosa cidade portuária. Aparentava ter por volta de vinte anos de idade e exibia um sorriso confiante. Seus cabelos negros bagunçados davam o tom de irreverência a sua própria figura. Estava acompanhado de um Pokémon grande, de coloração azul e amarela, não muito comum de se ver naquela região.

— Finalmente chegamos! — de seu bolso o rapaz tirou um PokéNav. — Bem a tempo de reservar um quarto no Centro Pokémon. Hoje vou jantar como rei, depois de todo esse tempo indo atrás de comida no meio do mato. E aí, ansioso?

O Pokémon assentiu, sua expressão era de empolgação assim como a de seu dono. Finalmente teriam algum conforto para aproveitar.

— Então vamos logo, Tai. Quero saber que tipo de novidades Slateport guardou pra nós.

Art by: Diego Chinatsu

FIM DO CAPÍTULO 18

  

FanArt #05 - Diego Chinatsu


Descrição: Trio principal em Dewford
Desenhista: Diego Chinatsu
Técnica: Paint Tool Sai e mesa digitalizadora

"Eu tava rushando todos os capítulos de AEH e acabei curtindo pra cacete a química do trio, aí quis desenhá-los."

Chinatsu é tão comunicativo lá no nosso Discord, mas dessa vez foi bem econômico nas palavras na hora de nos dar um breve comentário sobre a art que ele fez pra gente. Mesmo assim ele se expressou sem ficar enrolando. Um verdadeiro gênio na arte e na comunicação. Onde essa lenda vai parar?

Eu sempre fico empolgado pra receber as arts que o pessoal faz porque na maioria das vezes eles já mostram que estão fazendo. Então fico na ansiedade pra recebê-las e postar logo aqui no blog. Mas essa aqui me pegou muito de surpresa. Ninguém no grupo sabia de nada, e um belo dia o Chinatsu apareceu lá com esse desenho perfeito, já concluído, quase me matando do coração (você quase me fez uma outra boa ação além desse desenho maravilhoso, China).

A art já estava pronta há tempos, mas eu não tinha postado porque eu queria usá-la como art oficial no capítulo 18 pra representar uma cena deles se despedindo de Dewford. Só que o andamento do capítulo não estava indo como eu queria (o que causou esse hiato de 3 meses na história, coisa que não estava prevista) e acabei por resetar o capítulo 18, que agora já começa com eles em alto-mar, pois eu precisava dar uma avançada no rolê.

De qualquer forma a art está aqui, guardadinha na galeria pra quem quiser vir conferir. E já digo a vocês que o capítulo 18 sai em breve com direito a uma nova art desse ser iluminado.

China, você é o cara!

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